pau d´arco

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pau d´arco - UFMA - 2014

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012


socializando postagem do face de Paulo Abrão
De Paulo Abrão
Ex-coordenador da Funai na Amazônia, o indigenista José Porfírio Fontenele de Carvalho, 65, vai falar à Comissão da Verdade sobre as mortes de índios no período da ditadura militar. Ele foi testemunha do desaparecimento dos índios waimiri-atroari durante a construção da BR-174. 
A seguir, a Folha, no caderno ‘Poder’, publica depoimento dele: 
“Nasci em Granja (CE). Aos 19 anos, durante a ditadura, fui para Brasília estudar contabilidade na UnB. Tive vários conflitos com os militares. Aquilo foi me chateando. Surgiu um concurso de auditor contábil no Serviço de Proteção do Índio, antes de a Funai ser fundada, em 1967. Fui o primeiro colocado. Em RO, conheci o sertanista Francisco Meirelles. Apareceu um índio nu, com arco e flecha na mão, foi a primeira vez que vi um índio na vida. De noite, pensei: esse povo precisa da minha ajuda. Larguei tudo para trabalhar com os índios. Me especializei nos bravos e valentes. Quando cheguei a Manaus, encontrei o sertanista Gilberto Pinto Figueiredo Costa, ele tinha uns 30 anos. Éramos subordinados aos generais. Nosso contato com os índios waimiri-atroari era para montar postos de defesa. Eles não queriam fazer amizade. Começamos a fazer trocas de presentes: flecha por facão, panela de barro por alumínio. Em 10/1968, os militares contrataram o padre italiano Giovanni Calleri com a missão de amansar os waimiri-atroari para abrir a picada da estrada BR-174. O padre chegou à aldeia atirando de fuzil. Eram 11 pessoas, dez morreram flechadas. Os militares diziam que boicotávamos a obra. Fiquei preso uma semana. Houve outro massacre em outubro de 1974, morreram mais seis pessoas da nossa equipe. Fomos procurar o general Gentil Nogueira Paes, comandante do 2º Grupamento de Engenharia e Construção do Exército. Pedimos para parar a estrada. Ele disse: "Vou construir, mesmo que tenha que matar esses índios assassinos. Dei ordem para meter fogo". Saímos da reunião chorando, os índios não sabiam o que era estrada. Em 21/12/1974, o Gilberto recebeu aposentadoria à revelia. Fui transferido para Altamira [no PA]. Naquele mês vim para Manaus me casar. O Gilberto era o padrinho. Após chamado dos índios, ele deixou o casamento e foi encontrá-los. No dia seguinte, estava morto. A versão dos militares é que encontraram o Gilberto morto. Não vimos o corpo porque o caixão foi lacrado. Não sabemos se ele morreu flechado ou a tiro. Quero que a CNV investigue o que aconteceu com o Gilberto. Quando retornei a Manaus, em 1987, encontrei 375 índios na reserva [antes havia 1.500]. Eles disseram que houve ataques dos soldados. Prefiro que a Comissão apure, sem fazer alarde, e identifique como foram os métodos das mortes dos waimiri-atroari”.

domingo, 30 de dezembro de 2012


vale relembrar 
A VOLTA DE JESUS

 Frei Betto

Sem chamar a atenção, Jesus voltou à Terra em dezembro de 2011. Veio na pessoa de um catador de material reciclável, morador de rua. Comia prato feito preparado por vendedores ambulantes ou sobras que, pelas portas do fundo, os restaurantes lhe ofereciam.

Andava sempre com uma pomba pousada no ombro direito. Na porta de um teatro, estranhou o modo como as pessoas bem vestidas o encaravam. Lembrou que, na Palestina do século 1, sua presença suscitava curiosidade em alguns e aversão em outros, como fariseus e saduceus.

Agora predominava a indiferença. Sentia-se, na cidade grande, um Ninguém. Um ser invisível.


Ao revirar latas de lixo à porta de uma faculdade, nenhum estudante ou professor o fitou. “Fosse eu um rato a remexer no lixo, as pessoas demonstrariam asco,” pensou. Agora, nada. Nem o percebiam. Ou consideravam absolutamente normal um homem andrajoso remexer o lixo.

Graças a seu olhar sobrenatural, capaz de apreender alma e mente das pessoas, Jesus sabia que eram, quase todas, cristãs...

Roubaram um carro defronte da faculdade. A vítima, uma estudante cirurgicamente embelezada, apontou-o como suspeito de cúmplice dos ladrões. A polícia, sem pistas dos criminosos, decidiu prendê-lo para aplacar a ira da moça, filha de um empresário.

O delegado inquiriu-o:
- Nome?
-  Jesus.
- Jesus de quê?
- Do Pai e do Espírito Santo.

O delegado ditou ao escrivão:

- Jesus da Paz, natural do Espírito Santo.

A polícia conhece a diferença entre bandidos e moradores de rua. Tão logo a moça e seus pais deixaram a delegacia, Jesus foi liberado.

Saiu pela avenida, de olho nas vitrines das lojas. Todas repletas de enfeites de Natal. Tentou avistar um presépio, os reis magos, uma imagem do Menino Jesus... Viu apenas um velho de barba branca, gordo, com a cabeça coberta por um gorro tão vermelho quanto a roupa que vestia. O menino nascido em Belém havia sido substituído por Papai-Noel. A festa religiosa cedera lugar ao consumismo compulsivo e à entrega compulsória de presentes.

Impressionou-se com os rápidos flashes coloridos dos televisores expostos nas lojas. A profusão de anúncios. Comentou com o Espírito Santo:
      - Houvesse TV naquela época, teriam transmitido o Sermão da Montanha como um discurso subversivo e exibido no Fantástico a multiplicação dos pães. Se eu facilitasse, uma marca qualquer de cerveja iria querer me patrocinar...


Em busca de material reciclável, Jesus se surpreendeu com a quantidade e a variedade de lixo. Quanta coisa ele não conhecia! Como as pessoas consomem supérfluos! Quanta devastação da natureza!

Dormiu num banco de praça. Ao acordar, deu-se conta de que desaparecera seu saco repleto de latinhas e papéis. Possivelmente outro catador o levara. Pobre roubando pobre. Resignado, passou o dia revirando lixo para ganhar uns trocados e poder garantir a janta.

Tarde da noite, viu defronte de uma igreja. Decidiu entrar. Os fiéis, ao vê-lo tão maltrapilho, torceram o nariz. Jesus preferiu ficar de pé no fundo do templo. A Missa do Galo se iniciava. Achou o padre com cara triste, como se celebrasse um ritual mecânico. O sermão soou-lhe moralista. Não sentiu que houvesse, ali, a alegria da comemoração do nascimento de Deus feito homem. Os fiéis se mostravam apressados, ansiosos por retornarem às suas casas e se fartarem com a ceia natalina.

Terminada a missa, Jesus perambulou pela cidade. Pelas calçadas, sacos de lixo estufados de embalagens para presentes, caixas de papelão, ossos de frango e peru, cascas de ovos... Observou os moradores de um prédio reunidos no salão do andar térreo. Comiam vorazmente, estouravam garrafas de espumantes, trocavam presentes, abraços e beijos. Nada ali, nenhum símbolo, que lembrasse o significado originário daquela festa.


Passou diante de uma padaria que fechava as portas. O padeiro, ao ver o catador, pediu que esperasse. Retornou lá de dentro com uma sacola de pães, fatias da salame e um refrigerante.

- É pra você comemorar o Natal – disse o homem.

Jesus chegou a uma praça semiescura. Havia ali uma mulher excessivamente maquiada. Buscou um banco e ali se instalou para poder comer. A mulher se aproximou:
-                  Ei, cara, tem o que aí?
- Pão, salame e refrigerante.
-Não comi nada hoje. E a noite tá fraca. Faz duas horas que estou aqui e nada de freguês. Acho que em noite de Natal os caras ficam com culpa de pegar mulher na rua.

Jesus preparou o sanduíche e estendeu-o à mulher.

- Se não importa de beber no mesmo gargalo...

- Tenho lá nojo de alguma coisa? – murmurou a mulher. - Se tivesse, não estaria rodando a bolsinha na rua.

- Você não tem família?

- Tenho, lá na roça. Larguei aquela miséria pra tentar uma vida melhor aqui na cidade. Como não fui pra escola, o jeito é alugar meu corpo.
 
- Esta noite de Natal não significa nada pra você?

- Cara, você não imagina o que já chorei hoje lá na pensão. A gente era pobre, mas toda noite de Natal minha mãe matava um frango e, antes de comer, a família rezava um terço e cantava Noite feliz. Aquilo me deixava muito feliz. Não posso relembrar que as lágrimas logo inundam os olhos – disse ela,  puxando o lenço de dentro da bolsa.

A mulher fez uma pausa para enxugar as lágrimas e indagou:

- Acha que, se Jesus voltasse hoje, esse mundo iria melhorar?

- Não sei... O que você acha?

- Acho que ninguém ia dar importância a ele. Essa gente só quer saber de festa, e não de fé. Mas bem que ele podia voltar. Quem sabe esse mundo arrevesado tomava jeito.

- Eu não gostaria que ele voltasse. Não adiantaria nada. Há dois mil anos ele veio e deixou seus ensinamentos. Uns seguem, outros não. Se o mundo está desse jeito, a ponto de eu ter que catar lixo e você alugar o corpo, a culpa é nossa, que não damos importância ao que ele ensinou. Veja, hoje é noite de Natal. Jesus renasce para quem?

- No meu coração, ele renasce todos os dias. Gosto muito de orar, não faço mal a ninguém, ajudo a quem posso. Mas, sabe de uma coisa? Eu gostaria de poder falar com Jesus, assim como nós dois estamos conversando aqui.

- E o que diria a ele?

- Bem, eu perguntaria se ser prostituta é pecado. Já vi um padre dizer que sim, e ouvi outro falar que não. O que você acha?

- Acho que Deus é mais mãe do que pai. E lembro que Jesus disse um dia aos fariseus que as prostitutas iriam entrar no céu primeiro que eles.

Frei Betto é escritor, autor do romance “Um homem chamado Jesus” (Rocco), entre outros livros.

domingo, 9 de dezembro de 2012

marco passerini: Nenhuma vaga a mais!Pelo rompimento do encarcerame...

marco passerini: Nenhuma vaga a mais!Pelo rompimento do encarcerame...: Nenhuma vaga a mais! Pelo rompimento do encarc eramento em massa e pelo resgate do Estado Social de Direito! Desembarquei agorinha em ...